quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Se eu pudesse viver minha vida novamente... Rubem Alves


  • E que outra maneira existe de se comunicar com as pessoas comuns senão simplesmente dizer as palavras que o amor escolhe?
  • Escrevia para educar. Mas tinha horror ás escolas. Nas escolas se formam os rebanhos de ovelhas, todas balindo igual, todas pensando igual. Ovelha que balisse diferente, que pensasse diferente, ia para o manicômio ou era reprovada. Morreria de rir se tivesse tido a felicidade de ler a Adélia Prado: Escola é uma coisa sarnenta. Fosse terrorista, raptava era diretor de escola e dentro de três dias amarrava no formigueiro, se não aceitasse minhas condições. Quando acabarem as escolas, quero nascer outra vez.
  • Os silêncios são sempre embaraçosos porque nunca se sabe o que o outro está pensando...
  • Natal é triste porque se tenta pegar uma coisa que não volta mais. É (quase)luto, procura do que se perdeu... Tanto é assim que nele não se admitem coisas novas. As canções têm que ser as mesmas, pois é nelas que moram as memórias. E também os bolos e as frutas, nossos amigos de infância: sacramentos de uma meninice que se foi. E se fazemos tanta festa não é porque estejamos alegres. É para espantar a tristeza...
  • A alma é um cenário. Por vezes, ela é como uma manhã brilhante e fresca, inundada de alegria. Por vezes ela é como um pôr de sol, triste e nostálgico. A vida é assim. Mas, se é manhã brilhante o tempo todo, alguma coisa está errada. Tristeza é preciso. A tristeza torna as pessoas mais ternas. Se é crepúsculo o tempo todo, alguma coisa não está bem. Alegria é preciso. Alegria é a chama que dá vontade de viver.
  • O bom da literatura é que ela nos faz viajar por tempos e lugares aonde a gente nunca foi e nunca irá. Mesmo porque as coisas que existem na literatura não existem na realidade. A literatura tem os poderes dos deuses: ela faz existir coisas que nunca existiram e chama as coisas que não são como se fossem.
  • A Palavra se faz carne... Prova disso são os tremores que percorrem nosso corpo, ora como riso,ora como choro. Se tivessem acontecido de fato,elas seriam criaturas da história, tempo do "nunca mais". "Never more, never more", repetia o corvo de Poe. "Nunca mais" é o tempo dos mortos, das sepultura, do sem volta. Mas as estórias são criaturas do tempo da imaginação, tempo do eterno retorno, das repetições das ressurreições. Quando se conta de novo uma estória, aquilo que nela aconteceu no passado imaginário se torna vivo no presente. Sim já ouvimos a música muitas vezes. Sabemo-la de cor. Mas queremos ouvi-la de novo para sentir a sua beleza sempre presente, para rir e chorar. Assim é o tempo da imaginação. A alma é o lugar onde o amor guarda o que não aconteceu, sob a forma de imaginação, para que aconteça sempre.
  • As estórias são flores que a imaginação faz crescer no lugar da dor. Minhas estórias cresceram das dores da minha filha, que eram minhas próprias dores. por isso disse que comecei a escrever porque ela precisava delas, das estórias. Curar a dor, isso elas não podem fazer. Mas podem transfigurá-la. A imaginação é a artista que transforma o sofrimento em beleza. E a beleza torna a dor suportável Por isso escrevo estórias: para realizar a alquimia de transforma dor em flor. Minhas estórias são as minhas poções mágica... Não há contraindicações nem é preciso receitas...


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